Enquanto digito estas linhas, o mundo ainda olha com apreensão para o Japão. Depois do devastador terremoto seguido de tsunami de 11 de março, o vazamento nuclear da usina de Fukushima preocupa e ainda não se sabe quais consequências e quais as reais dimensões da tragédia. As notícias me atingiram pesadamente. Primeiro, a preocupação com parentes e amigos lá, que felizmente mandaram notícias tranquilizadoras. Depois, pela dimensão do terrível acontecimento. E há, também, outro fator. O Japão é a terra de meus avós e de lá surgiram quadrinhos, desenhos animados e seriados que me inspiraram e nos quais me tornei de certa forma um especialista. Eu devo ao Japão meu impulso em me profissionalizar como artista e lá nasceram e vivem alguns dos artistas que mais admiro. Visitei o país em 2008 como convidado do Ministério de Assuntos Estrangeiros do Japão e tenho enorme carinho pelo que o país representa. Com tudo isso acontecendo, claro que fiquei acompanhando tudo com atenção e pesar.
Nesse cenário desolador e com uma imprensa local que demora a divulgar o que acontece, o Twitter é uma preciosa fonte de informações e, como uma rede realmente global, pessoas daqui e do Japão buscam e dividem informações, ajudando-se e se solidarizando.
Infelizmente, enquanto muitos se preocupam, muitos brasileiros destilam piadinhas sobre o Japão. Riem das situações trágicas, achando tudo divertido, o que parece impensável para alguém com algum coração. Seguros em seus mundinhos alimentados pelo ego e na segurança do lar, riem da desgraça alheia achando que estão fazendo humor pra alegrar as pessoas e se expressar de forma inteligente.
E há também os que pensam que tragédias fazem bem, sob uma perspectiva histórica. Um ex-amigo certa vez comentou, anos atrás, que o Japão precisava “tomar outra bomba atômica na cabeça pra recuparar os brios”. Ele deve estar feliz agora. Certamente, quem solta uma frase dessas não gostaria de estar entre os mortos de uma tragédia “que vem para o bem” ou de estar procurando por entes queridos em meio a uma pilha de corpos. Uma coisa é tirar lições de uma desgraça, outra é achar que ela é ou foi benéfica.
Uma vez, num caso dramático ocorrido aqui mesmo no Brasil (ainda que de menores proporções), critiquei abertamente a proliferação de piadas no Twitter em cima da desgraça alheia. Imediatamente, um certo quadrinhista me acusou de defender a censura. Daí, começaram a pipocar críticas a mim. Um disse que “sempre tem um idiota querendo cagar regras na internet”. Um outro me chamou de “revolucionário de sofá”, dizendo que eu seria um que não faz porra nenhuma, só fica agitando sem tirar a bunda do lugar.
Aquilo mexeu com meus brios. Por que eu sempre fui engajado em causas nas quais acredito, apesar de não alardear isso. Mas vou comentar agora para quebrar aquela ideia que muitos têm de que a internet é feita de gente que não faz nada no mundo real.
Já ajudei - botando o pé na rua mesmo - campanhas de arrecadação para doentes de câncer, doentes do fogo selvagem (uma doença de pele rara e dolorosa), já visitei creches carentes, ia com amigos de igreja levar um pouco de atenção (e não pregações) a um asilo de idosos abandonados e atualmente ajudo voluntariamente uma ONG chamada Instituto Gabi, voltada ao apoio para crianças com deficiências, além de uma paróquia. Durante um tempo, fui muitas vezes ao Instituto da Criança do Hospital das Clínicas para fazer desenhos para as crianças internadas, algumas em situação trágica. Um quadrinhista bastante famoso ia lá com mais regularidade e nunca o vi expor isso. Por isso, quando leio certos comentários no Twitter, fico enojado com gente que se incomoda com bons sentimentos e prefere rir da desgraça alheia.
Ainda hoje, li um comentário irônico no Twitter que dizia que “rezar é a melhor maneira de não fazer nada. Se quer ajudar o Japão, vai pra lá, oras”. Ir para lá não é simples e acessível, ainda mais no atual cenário. Repassar informações úteis – como os contatos da embaixada e da Cruz Vermelha – é crucial para muitos. E nem todos podem ir pra lá, mas muitos podem repassar informações pertinentes e doar dinheiro para ações concretas. Mas às vezes, externar seu pesar e rezar acaba sendo tão criticado como piadas de mau gosto. Há gente que me causa repulsa, e falo de gente com cultura, alguns talentosos colegas de profissão inclusive. A falta de sensibilidade pelo sofrimento alheio é algo que me incomoda muito.
REPERCUSSÕES NO MUNDO POP
Alguns sites especializados em cultura pop japonesa informam sobre o paradeiro e estado de celebridades e pessoas ligadas ao mundo do entretenimento. É inevitável que logo fiquemos sabendo de vítimas famosas, mas vários artistas já se manifestaram.
Entre os que estão (até o momento) em segurança, estão os quadrinhistas Ken Akamatsu, Kia Asamiya, Masami Kurumada, Tite Kubo, os músicos Aya Matsuura, L´arc~en~Ciel, V6, Yoko Kanno, Hikaru Utada, JAM Project, Tetsuya Komuro e outros.
Há listagens bem extensas aqui (mangá/ animê) e aqui (música).
Assim que a situação lá começar a se normalizar, voltarei com a programação normal do blog. Por enquanto, continuarei acompanhando as notícias e postando o que julgar pertinente no Twitter.
AVISO:
Brasileiros que querem ajudar, leiam informações úteis aqui:
http://ow.ly/4dFyv